Projecto colaborativo Miguel Rios Design e Ângela Ferreira | (SUM)one: exercícios de apropriação
29.out.2009 | 08.nov.2009

Imagens

Obras

Press

Press Release

<p>(SUM)one: exercícios de apropriação</p> <p>Projecto colaborativo Miguel Rios Design e Ângela Ferreira</p> <p>Inauguração: 29 de Outubro às 21:30h<br /> Exposição: de 30 de Outubro a 7 de Novembro<br /> Conversa com Miguel Rios e Ângela Ferreira, moderada por Bárbara Coutinho, no MUDE – Museu do Design e da Moda às 18:30h de 3 de Novembro</p> <p>Imagem:</p> <p>Edifício Banco Nacional Ultramarino em Maputo (então Lourenço Marques)<br /> fotografado cerca de 1965, Bilhete postal Colecção de João Lourenço</p> <p>EXD’09, Projecto Tangencial</p> <p>Colaboração: MUDE e CML</p> <p>Apoio: Fabri</p> <p>MUDE – Museu do Design e da Moda</p> <p>Rua Augusta, 24<br /> 1100-053 Lisboa<br /> Tel. + 351 218886117, Fax. + 351 218886124, www.mude.pt</p> <p>Mais Info:<br /> miguel rios design<br /> tel.: +351 218 822 573<br /> fax: +351 218 822 574</p> <p>ÂNGELA FERREIRA</p> <p>/BNU, / 2009</p> <p>Componente 1<br /> Ferro e MDF; 372 x 186 x 80 cm</p> <p>componente 2<br /> MDF; 148,5 x 148,5 x 111 cm</p> <p>Assistência: Alexandra Baudouin</p> <p>Texto Folha de Sala: Jürgen Bock</p> <p>À Mesa do Ultramar</p> <p>O cruzamento de três referências – o Banco Nacional Ultramarino, a Casa Tugendhat e a moeda moçambicana, o Metical – constituiu a linha condutora do desenvolvimento da instalação BNU, o trabalho mais recente da artista Ângela Ferreira (Maputo, 1958).</p> <p>Nascida no Moçambique colonial, socializada artística e politicamente na África de Sul do apartheid, com uma carreira internacional que, desde os princípios dos anos 1990, se desdobra entre a Europa e a África, a artista procura nas suas pesquisas um lugar entre o Norte e o Sul, um lugar entre continentes, entre o colonizador e o colonizado, ou ainda entre as tentativas de definição dos “tempos” colonial, pós-colonial e neo-colonial, narrando-nos histórias que a História (de Arte) suprime nos seus métodos académicos de classificação. Perguntas como: qual historia? História de quem? e história para que fim? (Douglas Crimp) ecoam constantemente na obra da artista e nas reflexões originadas pela sua múltipla perspectiva de personalidade ‘in between’.</p> <p>O Banco Nacional Ultramarino (BNU) hoje só existe em Macau. Como emissor de dinheiro em todas as colónias – com a excepção de Angola, onde foi substituído pelo Banco de Angola em 1926 -, o BNU foi uma ferramenta essencial da política monetária do regime colonial português. A sede deste banco em Moçambique, erigida nos finais dos anos 1950, é um exemplo modelar da arquitectura modernista europeia. O seu “estilo internacional” foi introduzido pelos poderes imperiais nas respectivas colónias espalhadas pelo mundo através de um processo complexo que suprimia as filosofias utópicas (como, por exemplo, a emancipação da humanidade [Hannah Arendt]) que constituíam a força intelectual essencial para a materialização das formas da modernidade no campo das artes e das ciências.</p> <p>“Casa Tugendhat” foi uma das tentativas de materialização das utopias do modernismo que o arquitecto alemão Mies van der Rohe realizou. O seu conceito de clareza e os seus planos abertos, patentes em projectos como o Pavilhão de Barcelona e a Casa Tugendhat, em Brno, hoje República Checa, tornaram-se no fim dos anos 1920 “marcos miliares” da história de modernidade. No caso da Casa Tugendhat foi a parede em forma de uma meia rotunda instalada em espaço aberto que chamou a atenção do mundo arquitectónico: esta parede catapulta o visitante do foyer de entrada para a sala de estar, tudo com transições fluentes e sem as separações clássicas das divisões de uma casa. Há 80 anos atrás foi feita, portanto, uma proposta revolucionária do modo de viver a casa e da compreensão da própria arquitectura, fazendo com que esta acompanhasse as materializações utópicas e sociais da arte e do design, assim criando uma dinâmica específica entre a teoria e prática.</p> <p>A antiga sede do Banco Nacional Ultramarino na Rua Augusta, em Lisboa, alberga agora o Mude – Museu do Design e da Moda. É um prédio de século XIX que foi remodelado nos anos 1950/60 pelo arquitecto Luís Cristiano da Silva, apresentando-se hoje como referência do modernismo clássico de entre as guerras e dos anos 1950. Um brasão em pedra ao lado da porta principal anuncia a hegemonia monetária da Metrópole, integrando os escudos de Macau, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Goa, São Tomé e Príncipe e Timor, todo o campo de acção da instituição colonial. No percurso para o primeiro andar, quando se entra no foyer da sala de reuniões principal do Banco, surpreendentemente delineada por um tipo de design mesquinho, claustrofóbico, com lustres, nitidamente distinto da ambição modernista dos espaços públicos do Banco, houve um parapeito que chamou a atenção da artista. O parapeito limita o foyer do primeiro andar que dá para o espaço aberto do rés-do-chão e situa-se em frente da entrada monumental do Banco que está emoldurada por uma parede de vidro em “estilo internacional”. Foi esse parapeito em forma de meia rotunda que trouxe à memória da artista a parede emblemática de Mies van der Rohe na Casa Tugendhat .</p> <p>O bom e o mau das resoluções tomadas sobre o nosso bem-estar tem por regra origem nas decisões tidas por personalidades poderosas em redor de “mesas de reuniões”. Esse “círculo de poder”, muitas vezes figurado na forma arredondada dessas mesas institucionais, fica experienciado, numa época de anestesia das sociedades pelo espectáculo permanente das indústrias culturais, como coisa natural (Adorno, Horkheimer), impedindo-nos de imaginar qualquer alternativa “utópica” ao status quo de funcionamento da sociedade actual. Ainda assim, durante alguns anos, a independência de Moçambique deu azo à tentativa de procurar alternativas às sociedades dominadoras do Norte com um leque de actividades consideradas utópicas no período pós-independência (Jean-Luc Godard, Jean Rouch), mas que tiveram o seu fim com a guerra civil. Foi também por essa altura que o BNU se tornou no Banco de Moçambique, e hoje esta arquitectura emblemática da implantação do modernismo do colonizador em África adorna a face da moeda moçambicana de dez meticais, inspiradora da “mesa de reuniões” esculpida pela artista.</p> <p>Na instalação BNU, que integra duas esculturas e um desenho, são evocadas as complexidades das idas e voltas entre a Europa e a África, entre a modernidade carregada de utopia social dos anos 1920, proveniente da Europa Central e de Leste, e a sua materialização despojada dessas utopias, não só em África como também na Metrópole salazarista; são evocadas questões relacionadas com a aplicação das regras formais nas colónias – campo de experimentação dos poderes coloniais – e o reflexo desses resultados no “continente”; são evocadas questões entre a apropriação desse passado pelos povos independentes, recriando as suas próprias modernidades, e a negociação difícil do património colonial. Tudo isto se entretece numa rede sem formular respostas ou verdades confortáveis de assumir. A verdade é um lugar para ser encontrado entre estas referências pelo observador atento, que, no acto de descodificação de cada um dos elementos e do conjunto da instalação de Ângela Ferreira, assim define o seu próprio posicionamento nesta rede complexa, mas adequada, de coordenadas.</p> <p>Jürgen Bock</p> <p>[SUM]one</p> <p>Direcção conceptual e criativa: Miguel Rios</p> <p>Design de produto: Telma Barrelas – MRD</p> <p>Gestão de Projecto: Carla Rocha – MRD</p> <p>Consultoria de design e técnica: Inês Sabino – FABRI</p> <p>Engenharia de produto e produção: FABRI</p> <p>Folha de sala: Frederico Duarte</p> <p>(SUM)one</p> <p>O trabalho de um designer consiste em trazer o futuro para o presente.</p> <p>Joe Colombo</p> <p>Primeiro como artista e depois como designer, Joe Colombo testemunhou e interpretou através do seu trabalho as profundas mudanças tecnológicas e sociais ocorridas na Europa do pós-guerra. As formas, objectos e espaços criados pelo designer italiano reflectiram a sua crença no progresso da arte, da tecnologia e da humanidade. Foi a partir dessa crença que Colombo desenvolveu o conceito de habitat, um espaço dinâmico que rejeitava as convenções e tipologias estáticas do passado – como casa, divisões ou mobiliário mas também família, trabalho ou lazer – para se adequar às necessidades do homem moderno. As zonas – de dormir, de estar, de comer – deste habitat não corresponderiam mais às divisões de uma casa, nem seriam recheadas com mobiliário. Tal como a vida, cada espaço seria o que um indivíduo fizesse dele, cada zona um invólucro expectante, activado por equipamentos modulares e multifuncionais.</p> <p>A Minikitchen pretendia ser um desses equipamentos. Projectada para o fabricante de cozinhas italiano Paolo Boffi e lançada na Trienal de Milão em 1963, esta unidade com menos de meio metro cúbico em madeira e metal continha um fogão, um frigorífico, um abre-latas, gavetas para talheres, superfícies de trabalho e até espaço para livros de cozinha – tudo alimentado por uma única ficha eléctrica. Este todo móvel e dinâmico era mais do que uma soma de partes, mecanismos e funções: a Minikitchen não era um móvel de cozinha. Ela era a cozinha.</p> <p>Foi também a vontade de activar um espaço através de um equipamento que levou o gabinete Miguel Rios Design a criar o objecto (SUM)One. Criado a partir da apropriação formal e conceptual da peça /BNU, /2009 de Ângela Ferreira para uma apresentação conjunta pensada inicialmente para o edifício do MUDE – Museu do Design e da Moda, (SUM)One é, tal como Minikitchen, um esboço de futuro.</p> <p>A forma de /BNU, /2009, ao invés, tem origem no passado – mais precisamente no próprio edifício do MUDE, outrora a sede do Banco Nacional Ultramarino. Criado em 1864 como banco emissor para as colónias portuguesas, o BNU foi um dos principais braços do poder imperial português – e este edifício o epicentro desse poder. A divisão do museu onde as duas obras estariam expostas, a sala Dom Luís Pereira Coutinho, honra o administrador do banco que ordenou a remodelação do edifício da Rua Augusta. Esta inigualável obra “sem orçamento”, projectada por Cristino da Silva e inaugurada em 1964, data do centenário da instituição; nesse mesmo ano, Pereira Coutinho inaugurou também em Lourenço Marques outra emblemática sede do chamado “banco das colónias”. Projectado por José Gomes Bastos, este notório exemplo da arquitectura moderna portuguesa é hoje o mesmo edifício, mas tudo o resto mudou. A cidade onde se encontra não é mais Lourenço Marques. A colónia portuguesa é hoje uma república africana independente. E este imponente bloco de cimento e vidro não é mais a sede do poder financeiro da metrópole. É o Banco Nacional de Moçambique.</p> <p>Ângela Ferreira encontrou nas duas sedes de poder financeiro – e na tensão entre o espaço da primeira e a forma da segunda – terreno fértil para uma reflexão sobre o poder e o passado colonial português. Este é um objecto construído através da memória e da vida do seu autor, mas que procura, com a sua presença perante nós, activar a nossa memória colectiva.</p> <p>Ao apropriar-se de /BNU, /2009 e ao sujeitar este objecto a um raciocínio projectual característico do processo de design, o gabinete Miguel Rios Design constrói a partir da forma da sede do BNU em Lourenço Marques, evocada por Ângela Ferreira, uma nova obra inspirada na MiniKitchen de Colombo. Ao incorporar dispositivos mecânicos (rodas, gavetas, dobradiças) e sugerir novas funções (bancada de trabalho, mesa de refeições), (SUM)One pretende questionar a natureza do objecto artístico, atribuindo-lhe uma funcionalidade que lhe é ausente por natureza. </p> <p>Como em qualquer objecto, ou equipamento concebido através do processo de design, essa funcionalidade apenas existe quando é estabelecida a possibilidade de uma real interacção entre objecto e sujeito. Ou seja, quando é criada – e encorajada – a utilização de um artefacto por um indivíduo.</p> <p>É precisamente sobre os limites dessa (im)possibilidade que (SUM)One opera: apesar se encontrar no espaço de uma galeria e se apresentar num contexto artístico, este objecto não se encontra desprovido das funções que lhe dão sentido. Durante o tempo da exposição, é passível de ser aberto, fechado, mexido, tocado, usado. Mas mesmo que não lhe seja negada a possibilidade de ser posto a funcionar, aqui não é mais do que uma soma de partes que funcionam. A sua funcionalidade é aqui exposta como algo em potência, como cenário futuro.</p> <p>Afinal, esta galeria não é uma casa, nem sequer um habitat: por muito que Joe Colombo tenha desejado alterar a forma como activamos as zonas onde vivemos, há espaços que através da sua função activam eles próprios significados, metáforas, histórias a partir dos equipamentos colocados perante nós – e não o contrário. Aqui e agora, sabemos ser capim o que cresce no canteiro de solo africano. Mas quando a exposição acabar e tudo isto for retirado do espaço da galeria, o capim torna-se em erva, o solo africano torna-se em terra e (SUM)One poderá finalmente tornar-se num móvel de cozinha.</p> <p>Somente através da sua produção em série, distribuição e comercialização – elementos integrantes do próprio processo de design – (SUM)One poderá realmente ser posto em prática. Só assim o equipamento que se encontra à nossa frente poderá, tal como a Minikitchen de Colombo, encontrar a sua verdadeira função: responder às necessidades do dia-a-dia dos seus utilizadores e activar os espaços para onde for levado. Só então, libertos dos significados, metáforas e histórias do passado, poderemos trazer um novo futuro para o nosso presente.</p> <p>Frederico Duarte</p>

na obra

Artistas

No Results Found

The posts you requested could not be found. Try changing your module settings or create some new posts.